quinta-feira, 29 de outubro de 2009

O Buraco Negro do Sol

por Jean Coelho
Imaginem um deserto. Apenas o ar seco saindo da sua respiração ofegante será a única forma de refrescar o seu corpo. Agüentar o calor é aceitável. Não comer por algumas semanas seria o limite para alguém acostumado com refeições diárias. Entretanto, a falta de absorção de líquidos, principalmente água, é algo que não queremos nem em nossos piores pesadelos. A morte para quem fica sem beber água durante pelo menos uma semana talvez seja a pior de todas. O corpo humano é basicamente água. O equilíbrio do nosso organismo depende muito de estarmos bem hidratados. Para uma pessoa em especial, esse não foi o caso. Ninguém poderia ajudá-lo, pois havia perdido a memória em um acidente de carro. Ele não sabia mais o próprio nome. Sabia apenas que estava naquelas condições por um longo período de tempo. Completamente magro, seu esqueleto era visível sobre uma camada de pele seca, queimada pelo sol. Suas roupas rasgadas eram indícios de estar sofrendo muito naquele deserto que ele nunca vira antes. Visto de longe parecia um zumbi, mas tratava-se apenas de um pobre coitado desmemoriado.



O cérebro humano é 80% feito de água. A essa altura, pela falta de hidratação sua mente já sofria as conseqüências. Ele começara a ver coisas. Enquanto caminhava, tinha a impressão de estar sendo seguido. Durante a noite as temperaturas em um deserto pode chegar perto do 0°C, e é comum as pessoas procurarem abrigo ou mesmo se agasalharem. Porém o nosso amigo, que desconhecemos o nome, suava a noite toda enquanto tentava dormir. Parecia que estava na praia. Já durante o dia, o sol extremamente forte não fazia efeito mais sobre ele. Pelo contrário, fazia-o tremer como se estivesse preso dentro de um frigorífico. As visões estavam cada vez mais freqüentes. Sua imaginação lhe pregava peças o tempo todo. Houve um momento em que ele viu toda areia do deserto que estava debaixo dos seu pés virarem um mar negro, e ele se debatia na escuridão pois estava se afogando. E então de uma hora para a outra, tudo voltava ao normal. Sempre via pessoas no horizonte, mas nunca às alcançava. Mesmo com sua saúde mental comprometida, ele não entendia porque não tinha morrido ainda. Ele não fazia idéia, mas se passaram dois anos em que ele estava nestas condições, caminhando por um deserto sem fim. Até que em um dia estranhamente nublado, ele se ajoelhou na areia e disse:
"Talvez se eu não continuar andando, a morte virá me levar..."
Foi aí que ele caiu em um profundo sono, que não tivera a muito tempo. Mas acordou no dia seguinte e ainda estava escuro. Ao abrir os olhos viu que o sol havia ficado negro, como um buraco negro do espaço. O seu corpo começara a desaparecer como se fosse grãos de areia sendo levados pelo vento. Enfim se sentiu em paz, e desapareceu. Sem saber quem era, não sabia também que já estava morto a dois anos.




Fim


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